sexta-feira, 7 de setembro de 2018

O Brasil é o País do Blefe


A fraude no 'atentado de Juiz de Fora' não consiste em saber se a faca entrou ou não entrou, se teve sangue ou não, se o esfaqueador obedeceu ordens ou não, se a cirurgia realmente ocorreu conforme o boletim médico divulgado ou não.

Mesmo com probabilidades imensas de não serem fatos, na esfera do discurso e das pressões ideológicas, tudo isso vira diversionismo.

A fraude é na interpretação do acontecimento. É no oportunismo eleitoral. É no subproduto noticioso desencadeado pela comoção cenográfica em torno de uma factualidade simples, que é uma ‘tentativa de agressão com objeto cortante’.

Essa é a fraude.

quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Não deixe a democracia morrer


O grotesco não raro é seguido por repulsa e fascínio. François Rabelais consagrou os sentidos do grotesco com seus romances cômicos Pantagruel, de 1532 e Gargântua, de 1534. A escatologia é engrenagem importante na dicção de Rabelais e ele representa um divisor de águas para os estudos do humor.

O filósofo e ensaísta russo Mikhail Bakhtin fez uma análise clássica da obra do padre e escritor francês, traçando paralelos importantes entre o imaginário rabelaisiano e a cultura popular na idade média. Rabelais é fundamental para se entender a civilização e suas pulsões suicidas de aniquilação do sentido, bem como as cifras de sobrevivência e resistência subscritas no relato do absurdo.

Lembrei de Rabelais ao ver a cena em que Cármen Lúcia e Raquel Dodge cantam a canção popular “Não Deixe o Samba Morrer” ao lado de Alcione em uma das antessalas do STF. É assaz emblemático, seja como um estudo de caso, seja para o país de maneira geral e política.

Destaque-se que, enquanto as autoridades da república cantavam desajeitadamente um dos refrões mais populares do samba, sete manifestantes brasileiros agonizavam próximos ao STF, nos seus mais de 21 dias em greve de fome pelo julgamento da ação de constitucionalidade da prisão em segunda instância – que poderia libertar Lula.

Ação esta, diga-se de passagem, postergada pela mesma ministra que ali cantava quase que em estado de êxtase “Não Deixe o Samba Morrer”.

sábado, 28 de julho de 2018

Íntegra da pesquisa Vox Populi para presidente

Segue a íntegra da pesquisa Vox Populi, publicada há dois dias. É importante analisar os dados com bastante cuidado e atenção, porque o jogo eleitoral começou para valer e as posições estão sendo consolidadas, bem como as tendências. 

Voto espontâneo [comentário meu: é notável como a performance de todos os candidatos - exceto Lula - é pífia. É um cenário inédito de desproporção estatística]
 Voto espontâneo [a curva é muito significativa: brancos e nulos vão diminuindo e migrando para Lula. É o início das eleições]
 Voto estimulado [o voto estimulado é a habitual surra que Lula tem dado nos concorrentes. Destaque-se o teto de Bolsonaro. Na pesquisa anterior, ele tinha os mesmos 12%. A tendência de derretimento, em se levando em conta outros cenários, para o candidato do PSL, está posta]

quarta-feira, 25 de julho de 2018

As explicações para a bestialidade das nossas elites estão a caminho


O episódio do funcionário que homenageou Dilma com a escrita confeiteira afetuosa em uma singelo prato de sobremesa no restaurante ‘A Favorita’ - e recebeu uma 'retratação institucional' de seu patrão -  é emblemático demais. É a elite do atraso em sua plenitude didática. O fato de o proprietário se achar no direito de se manifestar a respeito e declarar que a homenagem ‘não traduz a posição do restaurante’ é o ó do borogodó da elite escravocrata e da mediocridade colonial que encrustam os donos do poder no Brasil.

O pior é que tem gente que acha que ‘é isso mesmo’, os analfabetos espirituais que habitam os interiores semi abastados do país, sobretudo os interiores de São Paulo. Conheço muitos pessoalmente. É a velha profundidade humana de um pires de café raso.

O Sr. Arecco (esse é o nome dele) dono do restaurante, não tem absolutamente nada a ver com o que pensa seu funcionário, nem com o fato de este funcionário manifestar seu pensamento dentro da ‘sua propriedade’.

Esse pensamento escravagista explícito da nossa elite, gesto escandaloso de ingerência cidadã, será em um futuro próximo tipificado como crime, tal como o crime de racismo e o crime de homofobia (é, na verdade, um desdobramento desses dois).
  
A ideia de que ‘propriedade física’ se desdobra em ‘propriedade intelectual’ é uma monstruosidade. É a mesma lógica que impera no Grupo Globo.

O dono da Rede Globo é absolutamente igual ao dono do restaurante: ambos não querem que seus funcionários tenham liberdade de expressão. Calcule, portanto, a indigência do nosso sistema de comunicação: o dono de um conglomerado de R$ 70 bilhões age como um dono de restaurante (com todo o respeito aos donos de restaurante).

terça-feira, 24 de julho de 2018

O abandono dos programas de vacinação faz a morte rondar o país



Temer é a expressão máxima da catástrofe humana. Ele deveria – deverá – ser condenado um dia por crimes contra a humanidade. O que ele faz com o patrimônio público é caso de polícia, é o tucanismo em seu grau mais degradado de subserviência sub intelectual.

Mas o que ele faz com a questão humanitária no Brasil só tem paralelo com os maiores genocidas da história moderna, de George Bush a Saddam Hussein, de Pinochet a Donald Trump.

Temer não está sozinho nisso, claro: é ele e seu governo, ambos tomados pelo tucanismo mais medíocre e subdesenvolvimentista, uma parceria infame da desgraça.

Na linha desse tucanismo destituído de toda e qualquer capacidade gerencial e ainda acometido de uma gama imensa de ressentimentos e frustrações intelectuais, Temer simplesmente abandonou os programas de vacinação universal brasileira, um dos programas de imunização mais elogiados do mundo.

A cobertura de vacina no Brasil é – foi – uma das mais bem sucedidas do mundo, é preciso dizer e destacar. Erradicou várias doenças e colaborou para que o Brasil democrático do passado cumprisse as metas do milênio com 10 anos de antecipação.

Desde o golpe, a mortalidade infantil cresceu, dezenas de doenças erradicadas retornaram com força e, neste infeliz dia de hoje, ficamos sabendo que, só este ano, mais de 840 pessoas morreram em função de gripe, sendo que a maioria é de crianças.

Tudo porque o ministério da saúde foi sucateado e rifado, evidentemente, pela brutal falta de visão estratégica e humanitária de um governo que já nasceu podre e usurpador de ofício.

Temer chegou a tirar dinheiro dos programas de vacinação para colocá-lo em campanhas de propaganda pessoal, direto nos cofres da hiper aparelhada Secom.

O resultado é esse. O Brasil não resistiria, de fato, a uma nuvem de gafanhotos tão assassina. Interromper processos delicados e longos de assistência médica e social, só para demarcar distância ideológica dos governos do PT se mostrou uma das mais incríveis estupidezes que a história política do Brasil teve a capacidade de produzir.

Não há literatura para isso. Dará um trabalho imenso verbalizar e organizar tamanha loucura de uma casta de políticos corruptos alçados ao poder por uma imprensa suja e igualmente genocida.

segunda-feira, 16 de julho de 2018

A propaganda enganosa das consultorias de educação, por Gustavo Conde


Dos agentes supostamente imbuídos de algum projeto sério, os mais perigosos são os embrulhados em papel celofane. Eles decoram as práticas redacionais semi-acadêmicas, lapidam uma dicção com ares de contundente e dizem o que todos querem ouvir. São os chamados ‘carreiristas’, espécime que sempre goza de popularidade relativa nos nichos domesticados do mercado.

No mundo da educação, isso se torna quase metalinguagem. Onze entre dez analistas que dizem que ‘as pessoas não sabem ler’, não sabem ler. É um sintoma. Fica até constrangedor apontar o vexame, porque, afinal de contas, é um terreno em que o narcisismo e a libido transbordam a cada argumento mal feito.

Eu me senti obrigado a comentar parágrafo por parágrafo do artigo desde cidadão que atende pelo nome de Otávio Pinheiro, e que foi publicado no jornal Folha de s. Paulo. Trata-se de propaganda enganosa. Abaixo, o artigo comentado [meus comentários vão em colchetes, logo abaixo do fragmento-objeto do comentário]

Nunca se escreveu tanto, tão errado e se interpretou tão mal

[que título modesto. Melhor seria dizer: todo mundo é burro e só eu sou inteligente]

Saber ler e interpretar é questão de sobrevivência e amplia nossos horizontes

[alguém já leu algum clichê mais elementar do que esse?]

A pesquisa Indicador de Alfabetismo Funcional, conduzida pelo Instituto Paulo Montenegro em parceria com a ONG Ação Educativa, aponta que apenas 22% dos brasileiros que chegaram à universidade têm plena condição de compreender e se expressar.

[o primeiro parágrafo deixa claro: o Instituto Paulo Montenegro e a ONG Ação Educativa são ‘palavras-chave’. A reflexão se inicia mostrando os dentes: é interessada e marqueteira]

Na prática, esses jovens adultos estão no chamado nível proficiente –o mais avançado estágio de alfabetismo. São leitores capazes de entender e se expressar por meio de letras e números. Mais ainda, compreendem e elaboraram textos de diferentes modalidades (email, descrição e argumentação) e estão aptos a opinar sobre um posicionamento ou estilo de autores de textos.

[Decorou direitinho os pressupostos técnicos internacionais da ‘moda’ sobre leitura e escrita. E só. O mundo deu voltas depois disso. Aceitar o modelo de maneira passiva sem levar em conta realidades específicas culturais e econômicas é desonestidade intelectual, para dizer o mínimo] 

domingo, 15 de julho de 2018

O uso de agrotóxicos retóricos no jornalismo, por Gustavo Conde

A Folha faz uma matéria extensa hoje sobre o uso dos agrotóxicos, no limite da canalhice. A matéria é aparentemente digna, o texto é gramaticalmente aceitável, as informações são no limite do razoável, as coletas de dados são médias, as afirmações dos especialistas parecem constituídas de relevância técnica e algum contexto histórico, enfim, o trabalho dos jornalistas Reinaldo José Lopes e Gabriel Alves poderia merecer até um ‘parabéns’ do editor-chefe.
  
O problema, parceiro, é o viés. Essa coisinha chamada ‘viés’ é a grande desgraça do ‘Braziliam Journalism’. A manchete é “Veja mitos e verdades no debate dos agrotóxicos” e o ‘olho’ da matéria é: “Discussão do projeto que facilita a liberação dos produtos na agricultura acirrou os ânimos de ambientalistas e ruralistas”.

O protocolo das redações pode inocentar os missivistas: quem assina a matéria não é quem faz o ‘olho’ e a manchete, por isso os repórteres não podem ser responsabilizados pelo escopo explicitamente enviesado da matéria. Por que enviesado? Porque protege o governo Temer e sua tentativa canalha de enfiar agrotóxicos goela abaixo da população brasileira.  

Através de um pressuposto malicioso (o de que o agrotóxico é um mal necessário) e de ‘zonas de silêncio’ estrategicamente selecionadas (as de que o mundo do cultivo é exclusividade dos grandes produtores), a matéria instala uma falsa discussão ‘objetiva’ e técnica, na linha obsoleta da dicção que busca ‘neutralidade’.

Nota técnica da linguística: nada na língua é neutro. Essa falácia ainda impera na maioria das redações falimentares brasileiras. Eles leram a teoria da comunicação de Jakobson (publicada em 1962) e ficaram nisso. Ignoraram a imensidão que se produziu depois desta obra (e que a superou) na área dos estudos da linguagem. Óbvio que, para o jornalismo brasileiro e no que diz respeito às teorias da linguagem, o tempo parou nos anos 60. É o jornalismo retrô.

quinta-feira, 31 de maio de 2018

O caos da imprensa brasileira, por Gustavo Conde

Chega a ser engraçado observar os movimentos do governo e da mídia em meio à greve interminável e seus desdobramentos igualmente intermináveis. O Brasil não será mais o mesmo depois dessa greve, nem que queira.
 
O Brasil não será mais o mesmo nem a imprensa será mais a mesma. A imprensa teve o seu momento de auto flagelo e de auto ridicularização. Não fossem as mídias alternativas, o Brasil estaria nadando em desinformação generalizada – como, aliás, sempre nadou.

O débâcle da imprensa começou com a divulgação dos arquivos da CIA sobre Geisel. A informação demoliu a produção historialista do glorioso colunista Elio Gaspari, com seus seis volumes de ‘Fake History’. Locado no jornal Folha de S. Paulo e n’O Globo, Gaspari não conseguiu se explicar nem se safar do mico de ter feito um ‘fichamento’ em seis volumes de péssima qualidade factual e historiográfica. Vai para a lixeira do pensamento, junto com os livros do Fernando Henrique Cardoso.

Anunciava-se ali, com essa revelação sobre os governos golpistas Geisel e Figueiredo, a coleção de maus momentos que a imprensa familiar brasileira iria viver com intensidade dramática. A Ditabranda da Folha ressuscitou como o pressuposto mais fajuto jamais publicado em nenhum jornal avacalhado do mundo, por mais vendido que fosse. Feio.

A Dona Folha, aliás e em tempo, foi esculhambada pela sua competente ombudsman nesse último domingo. Paula Cesarino Costa afirmou que a imprensa foi “atropelada pela greve dos caminhoneiros”, com destaque especial para o veículo que a emprega.

quinta-feira, 24 de maio de 2018

A greve dos caminhoneiros são os vinte centavos do governo Temer


A paralisação dos caminhoneiros entra em seu quarto dia e faz um estrago que não era esperado nem por eles, caminhoneiros. Aliás, o gatilho desta greve não é a classe ou o sindicato: é um movimento patronal - não são caminhões de frete, mas caminhões de transportadoras.

Até aí, tudo bem. Todos já sabemos das cartas marcadas que grassam pelo Brasil pós golpe. Mas o Imponderável de Almeida (primo do Sobrenatural de Almeida, afilhado do Nelson Rodrigues) resolveu aparecer na cena política nacional de novo. E, dessa vez, ele veio com tudo (com Supremo, com tudo).

Essa paralisação meio fake, meio pelega, é a re-edição dos 20 centavos pré Copa das Confederações: um movimento meio besta que foi aproveitado pela imprensa golpista para exterminar a popularidade do governo Dilma, que já vinha baixa.

A senha para aquele movimento meia-boca virar nacional foi o espancamento de manifestantes na Avenida Paulista pela polícia militar de Geraldo Alckmin. A partir dali, a indignação foi tanta que a classe média sempre acovardada resolveu sair da toca e brincar de depredação de grife (lembram dos playboys tatuados apedrejando as vidraças do Congresso Nacional?).

Semelhanças à parte, a greve dos caminhoneiros não esperava tamanho ‘sucesso’, vamos dizer assim. O que importa aqui – o que é o similar histórico ao ‘espancamento da PM da greve dos caminhoneiros’, estopim para catarse popular em torno de uma causa difusa – é justamente o imponderável: a péssima gestão de crise do governo golpista. 

terça-feira, 27 de março de 2018

A morte do fato, por Gustavo Conde

"Contra fatos não tem argumentos". Eu ando meio injuriado com essas expressões populares. Elas são motores violentos de perpetuação de poder, enunciados saídos diretamente da opressão, do esmagamento, da subserviência, da conformidade, da paralisia.

Pergunte a algum acionista de bolsa de valores se ele acredita nessa premissa. Ele lida exatamente com seu contrário. Porque ele sabe que os mercados oscilam ao sabor dos argumentos dispersos mundo afora. Uma fala mal formulada de um ministro pode fazer as ações de uma gigante do petróleo perderem 40% de seu valor num único dia. E aí? Quem determina quem, o fato o argumento ou o argumento o fato?

Calculem o que é uma expressão popular que atravessa os séculos - e que portanto foi espontaneamente formulada por uma sociedade de 200 anos atrás, mais ou menos. Não pode ser portadora de alguma "verdade", senão por sintoma. Ou: são ditos que visam preservar o controle de quem já controla, com imenso viés patrimonialista.

É a mesma função das histórias infantis ou das fábulas. João e Maria se perdem na Floresta e uma bruxa quase os devora. Portanto, "não saiam na floresta, crianças". As histórias infantis são até mais sofisticadas. Os adultos, séculos afora e adentro, fazem um papel muito mais passivo e dócil diante das narrativas de controle social. Uma criança - graças a Deus - ainda sai na floresta. Ela tem algo dentro de si chamado "curiosidade". 

quarta-feira, 21 de março de 2018

Síndrome de Rimbaud, por Gustavo Conde

Não sei se vocês estão acompanhado, mas Mark Zuckerberg e o Facebook estão sendo acossados pelo governo americano e por governos e imprensa em geral. Precisa desenhar?

Precisa. A marca do Facebook é a mais forte do mundo, mas as pessoas e as empresas que as usam não querem se submeter às regras de um garotão. De uma certa forma, o Facebook enfrenta um novo tipo de preconceito: o preconceito aos jovens geniais.

Homens brancos e velhos dão as cartas no mundo dos bilhões. Quando um jogador diferente senta nessa mesa, os veteranos praguejam, hesitam, cochicham e sacam as pistolas.

As falas da personagem de Sean Parker no filme "A Rede Social" são um tratado dessa síndrome. "Ninguém quer receber ordens de um moleque de 20 anos que é mais inteligente e talentoso do que você."

Essa síndrome se alastra. Empresários, publishers, editores se descabelam e conduzem uma campanha global de difamação, via conglomerados de mídia e artigos cirurgicamente encomendados - e pagos - a supostos especialistas em tecnologia. A ordem é: ataque-se o Facebook.

Usuários também provocam minha curiosidade sociológica. Não saem do Facebook e passam essas horas em rede atacando o próprio suporte que lhes dá voz.

A recomposição partidária brasileira - Parte 1, por Gustavo Conde

A situação é simples. O poder instituído e opressor precisa de um posto avançado nas fileiras populares de fato. Antes, esse posto era o PSDB, um partido supostamente de centro-esquerda e supostamente com projeto. O PSDB bastava para Folha, Globo et caterva como uma grife, uma marca que lhes permitissem dizer: olha como nós nos preocupamos com a questão social.

Essa marca morreu. O PSDB é o partido mais rejeitado do país - isso está nas pesquisas do 360, do Vox Populi e do Paraná Pesquisas, direta ou indiretamente. O PSDB virou um partido de direita, com bandeiras similares às de Jair Bolsonaro. Eles só não assumem essa condição de uma vez porque continuam em cima do muro. O PSDB é a covardia em forma de partido político.

Isso posto, o consórcio de poder classista precisa de uma marca adicional para poder continuar "dialogando" com segmentos progressistas. Sem segmento progressista - e isso deve estar no manual de redação política interna dos Frias e dos Marinhos - não se hegemoniza o termômetro da democracia controlada.

sábado, 10 de março de 2018

A hora e a vez das mídias alternativas, por Gustavo Conde

O Globo recebe dinheiro direto do mercado de propinas legalizado publicitário brasileiro, o "bônus de volume" do Grupo Globo. Por isso, não morre tão cedo. Mas Folha, Estadão e Veja dependem do rame-rame publicitário regional e dos favores pontuais do governo federal.
Basicamente, quem sustenta Folha, Estadão e Veja é o governo tucano do estado de São Paulo. Se o PSDB perder em São Paulo, esses três veículos não duram um ano (claro: se o vencedor não for o MDB ou um partido de aluguel).
À exceção do PT (e só o PT), o estado de São Paulo é povoado por partidos de aluguel. São todos propriedade do PSDB. Prefeituras do interior de São Paulo? Qua, qua, qua. PV, PSB, DEM, MDB, nanicos "do inferno", tudo é propriedade do PSDB de Geraldo Alckmin. Chega a ser risível quando alguém me diz que "é do PV". Eu digo: "é mesmo? V de Verde?". Nem eles sabem explicar direito o que representam.
E aí, passando os olhos no sempre péssimo jornalismo estampado na home do Estadão, fiquei pensando: quem paga por isso, caramba? Que vergonha! Anunciar aqui? Quem vai comprar um produto anunciado aqui? Só a elite quatrocentona de São Paulo, que é cada vez menor.
Folha, Estadão, Veja. A folha de pagamento desses caras é alta - ainda que paguem mal seus funcionários. É muita estrutura. Seriam muitos impostos também, mas sabe como é que é, né. Com três governos "amigos", Doria, Alckmin e Temer, esses veículos devem estar nadando em engenharia fiscal.
Daí, eu vejo, revejo, leio, releio um texto qualquer daquele jornal. Dá aquele sono pela absoluta lentidão e pela tradicional ausência de consistência factual, temática e narrativa. Há textos bons no Estadão, nas matérias especiais que não são de política, claro. Mas, é até uma pena que esses jornalistas estejam escondidos em um jornal como aquele.

Daqui do Facebook, por Gustavo Conde

Mais uma vez, repito: sou como a lagartixa. Não tenho o rabo preso nem comigo mesmo. De sorte que prefacio minha própria mini pensata dizendo isso porque sei que sensibilidades contorcer-se-ão na luxúria vacante dos delírios em rede.

Mesóclises à parte, vos assevero: compreender o que é novo exige desapego e uma ou outra gota de liberdade intelectual. O sujeito histórico se amarra, com razão, aos sentidos pré estabelecidos com imensa docilidade. São cães de guarda.

Do ponto de vista semântico, quase a totalidade da população mundial é conservadora. Só as crianças e os adolescentes escapam dessa estatística macabra - por isso, gosto tanto deles.

Mas, Gustavo, quanta enrolação, meu filho. Vai direto ao assunto! Não.

Tá bom, tá bom.... Eu vou.

De repente, o Facebook se transformou de novo no grande inimigo da "causa". É até tedioso. A porção social que se dispõe a produzir conteúdo também é preguiçosa - diferentemente da direita que é preguiçosa full time. Luta-se, luta-se, luta-se e, quando surge uma dificuldade inesperada, a culpa é de quem? Do Facebook.

Muitas mídias ainda não entenderam o que é o Facebook. Ainda que tenham ética jornalística, elas ainda operam dentro da "Lógica da Ana". Ou: da Ana Lógica.

São analógicos. Não é fácil lhes tirar a convicção. Eu só fico olhando. Porque não há na face dessa terra plataforma mais inteligente e democrática que o Facebook, para desgosto e profunda tristeza de toda legião de insatisfeitos.

Este singelo espaço que está diante de vossos olhos - o meu humilde perfil - é um dos instrumentos mais espetaculares de produção e gerenciamento de sentidos e de debates [este texto foi originalmente escrito para o Facebook]. A dicção aqui é coletiva. Eu me aproprio da inteligência de vocês e costuro reflexões frenéticas diariamente, dentro dos meus limites, mas também dentro de uma linha narrativa que se propaga e reflui, re-significada, em forma de comentários e desdobramentos, num processo sem fim. 

Do que se reclama, afinal, meu Deus?

sexta-feira, 9 de março de 2018

A idade da desrazão, Por Gustavo Conde

A questão da idade (tenho que dizer, com licença). O problema não são os bebês, nem os adolescentes, nem os adultos, nem os velhos, nem os mortos. O problema é o poder. O problema é a população economicamente ativa que se traduz no grau máximo da escala Richter do Darwinismo social.

Minha geração é o 'ó' do borogodó. Perdeu o sonho de criança e ainda não chegou na generosidade da velhice. É uma geração desgarrada, perdida, partida, destituída de sentidos. Se lerem este texto, vão inclusive dizer que estou "generalizando", tal é a hiperinterpretação que se apoderou de suas mentes inseguras. Não estou generalizando, estou argumentando. Não preciso dizer que há exceções. É desnecessário, deselegante, autoexplicativo.

O 'macho adulto' tem hormônio demais na cabeça. Inclusive são experts em projetar a responsabilidade pelas mazelas do mundo aos adolescentes. "Esses adolescentes estão perdidos". "Na minha época, era bem melhor". Quem não tem um parente obtuso ou um colega de trabalho que não teça essas peças da ignorância aplicada?

O ser de meia-idade é também de meio-raciocínio, social e conceitualmente falando (deixa eu desenhar, porque senão aparece alguém aqui esbravejando e me acusando de ser portador preconceito etário). Eu falo de uma 'posição social', gente. É o poder. Quem detém o poder na sociedade? Não são os velhos, nem as crianças, nem os adolescentes: são os machos adultos, cáspita! (Que, diga-se, desdobram-se em todos os gêneros e idades, tal é a sua força econômica, simbólica e cultural).

sábado, 24 de fevereiro de 2018

A ‘Síndrome de Huck’ (ou a morte da aristocracia do texto)


Grande parte da frustração/incompreensão/fobia dos colunistas "old school" com relação ao Facebook é puramente de ordem libidinal. É algo tão simples de explicar que chega a dar preguiça. Por isso, vou complicar um pouco e vou acrescentar outros ‘sujeitos’ à pesquisa.

Não se trata apenas de colunistas, bem entendido. São artistas, escritores, celebridades e subcelebridades com pendores político-existenciais de toda sorte e uma dose maciça de PCA (Puta Carência Afetiva) - além, é claro, do péssimo hábito de serem paparicados desde a mais tenra construção analógica da fama.

Sim, essas criaturas são do período pré redes sociais e não se adaptaram a ele. A seleção natural já os excluiu desse processo da evolução do universo simbólico-social. A transição, no entanto, é lenta. Eles vão reclamar até que ninguém mais dê bola (até a imprensa deixar de publicar suas reflexões profundas e saudosistas).

O elemento homenageado de hoje é o colunista de jornal tradicional. Mas poderia ser um ator da Globo, um ex-participante de BBB, um jogador de futebol, um escritor consagrado, um professor renomado ou mesmo um apresentador de televisão.

sábado, 17 de fevereiro de 2018

A blogosfera e os acontecimentos políticos

E a blogosfera - o termômetro político mais confiável neste momento - acentuou a percepção sobre o significado da intervenção militar no Rio. Requião, no 247, antecipa que ela tem como objetivo o caos, para, assim justificar o cancelamento das eleições.
Kátia Abreu, no mesmo 247, diz que a intervenção é cortina de fumaça para atenuar a derrota do governo na reforma da previdência (leitura compartilhada pela grande imprensa).
Nassif põe a conta na Globo, com extrema fidelidade aos fatos. Deixa entrever que o desfile da Tuiuti realmente atingiu o governo e aponta para o recrudescimento do golpe, mais uma vez.
O Tijolaço costura mais um texto épico, sobre o comandante da operação, o general Braga Neto. Fernando Brito questiona se o general vai combater o crime organizado de frente ou se vai apenas fazer pirotecnia. Óbvio que ele sabe que é a opção 2. Mas Brito é tão correto e tem tanto caráter, que deixa em aberto a soberania estratégica do quadro militar.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

O STF e a cabeça de Lula

Reza a lenda que Herodes mandou prender João Batista porque este lhe recriminara o desposamento da cunhada, Heródias. A prisão não foi nada. Bom mesmo foi a festa de aniversário de Herodes dias depois.

A filha de Heródias, Salomé, dançou lindamente, tal qual uma Vênus Platinada, e encantou os olhos obsessivos de todos os presentes, sobretudo os do rei Herodes, bêbado e nos píncaros da lascívia debochada.

Claro que ele falou o que não devia: disse a Salomé - aquele pedaço de mau caminho - que ela poderia lhe pedir o que quisesse que ele o faria, sem questionamentos.

Salomé, então, orientada pela mãe - uma senhora bonita, de nariz adunco e olhos lânguidos -, pede algo delicadamente inusitado: a cabeça de João Batista numa bandeja.

Chocado, mas sem poder voltar atrás e retificar sua palavra, uma vez que poderia melindrar a 'opinião pública' da Galileia, Herodes ordena a decapitação.

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Quem seduz é a mulher. Ainda bem.

Deneuve e as 99 francesas da carta ao Le Monde chamaram a atenção do mundo porque, no fundo, são mulheres defendendo homens. Homens adoram isso (que uma mulher o defenda). É um desdobramento do complexo de Édipo.

A psicologia masculina, vamos combinar, é uma das coisas mais primitivas de que se tem notícia. Homem que é homem nem sabe o que é sexualidade. Podem saber até definir o verbete, mas manifestar e modular a própria sexualidade é algo que me parece distante da realidade masculina, com todo o respeito.

Fico pensando se Lacan sabia lidar com sua própria sexualidade. Construir uma teoria ele soube. Mas e na prática?

O tema é um óbvio tabu. Sexualidade de homem é sinônimo de testosterona. Homem que manifesta alguma complexidade na arte da sexualidade acaba se descolando da significação de "homem".

A sexualidade do homem é um oxímoro. Ela se resume, basicamente, em ereção, penetração, orgasmo e cansaço. Difícil a vida da mulher heterossexual. 

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

A arte e o caráter do texto

Uma coisa, a gente já deveria ter aprendido faz tempo: arte não tem nada a ver com caráter. Quase todos os grandes artistas têm condutas e teses problemáticas, para dizer o mínimo.

Quando falam sobre sociedade e política, então, sai de baixo. Aparentemente, eles enunciam apenas com os respectivos nomes e isso é fatal. Fãs amam, sempre. E em geral, fica nisso.

Essa é uma das consequências das redes sociais - que eu, particularmente, adoro: a celebridade foi desmascarada enquanto sujeito portador de algum conteúdo intelectual. Salvo raras exceções, são seres vazios, não conseguem formular ideias básicas para  debate público.

A era pré internet os protegia. Produziam espaços de escuta sempre muito favoráveis - as entrevistas sempre foram para "levantar a bola", para "divulgar o trabalho", para preencher vazios existenciais.

Nossa, mas como você é chato! Sou. E dentro dessa chatice, poder-se-ia perguntar: quem, então, enuncia com propriedade para o debate público?

domingo, 7 de janeiro de 2018

Aos jornalistas, com amor

Profissão ingrata a de jornalista. Ao ver Pedro Bassan comemorando o pagamento de 10 bilhões de reais pela Petrobrás no acordo feito com a justiça americana como se fosse uma vitória do Felipe Massa, ou Délis Ortiz com sua dicção técnica dizendo de maneira assertiva que Roberto Jefferson se emocionou com a nomeação de sua filha para o ministério do trabalho, o meu sentimento foi de ‘expectoração’. Sim, eu tossi.  

Triste conjuntura sociológica de um país que produziu um profissional absolutamente singular. O jornalista brasileiro é um produto intelectual acabado da nossa herança escravagista. Ele serve e protege o seu senhorio com fidelidade canina e dedicação maternal. Os fatos, para ele, são mero detalhe. O que importa é se seu 'trabalho' agrada ou não.

Essa auto identificação complexa, consentida, preservacionista e certamente contraditória pode ser observada em várias facetas da prática jornalística tupiniquim.

A primeira percepção é a de que o jornalista corporativo brasileiro, locado em uma grande redação, acha que é, ele mesmo, o próprio patrão, que tem toda a liberdade para escrever, fotografar e apresentar sua leitura técnica dos fatos. 

terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Dois Mil e Desenfinito

O ano começou bem. Doria pagando um mico monumental (em vetar a homenagem a Marisa Letícia), Freixo sendo a vacina - o anticorpo enfraquecido - para a esquerda não se iludir com a mídia, Dilma Rousseff na vice liderança das pesquisas de intenção de voto (favoritíssima ao senado), Lula batendo o bolão de sempre, 'intelectualizada' de grife no ostracismo e já no profundo esquecimento (obrigado), Luciano Huck implorando para continuar nas pesquisas, Temer acossado pela própria imprudência com a saúde (sua e do país), direita no fosso profundo da rejeição popular (como deve ser) e esquerda - a exceção de Freixo - unida e cada vez mais forte.
Fatos ruins, mas que irão precipitar a resposta democrática: massacre de presos em Goiás (9 mortos, duas decapitações, 100 fugas), guerra civil no Rio Grande do Norte, exército sobrecarregado com operações de segurança devido à incompetência generalizada dos estados e do poder executivo, Cármen Lúcia delirante, jurisdicionando assuntos que não são seus e enterrando a imagem da justiça brasileira e os 170 homicídios diários aqui na Terra de Vera Cruz (3 vezes maior que na Venezuela).

segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Vitimização e marketing

A vitimização é uma das estratégias mais mesquinhas do mercado político. E a freguesia dela é vasta, tanto dos que a representam para si, quanto dos que se valem dela para fulminar falsos algozes, num exercício covarde de assassinato de reputações em doses homeopáticas.

O caso Freixo é emblemático. O sujeito aceita as carícias retóricas de um jornal escancaradamente reconhecido como falso conservador (o mais perigoso dos conservadores), desfila um caminhão de clichês da pior qualidade possível, revela um lado narcísico absolutamente desconhecido (um verdadeiro "furo" de reportagem), confabula com a voz do jornal encarnada na pele da entrevistadora, atinge um grau de ridículo inacreditável para um suposto filiado a partido de extrema esquerda (mancha a imagem da extrema esquerda - sic), choca adeptos e detratores pela canastrice exacerbada e, finalmente, aponta na própria entrevista-armadilha, a senha para a repercussão esperada por ambos, Folha e Freixo: o vitimismo político.