terça-feira, 27 de março de 2018

A morte do fato, por Gustavo Conde

"Contra fatos não tem argumentos". Eu ando meio injuriado com essas expressões populares. Elas são motores violentos de perpetuação de poder, enunciados saídos diretamente da opressão, do esmagamento, da subserviência, da conformidade, da paralisia.

Pergunte a algum acionista de bolsa de valores se ele acredita nessa premissa. Ele lida exatamente com seu contrário. Porque ele sabe que os mercados oscilam ao sabor dos argumentos dispersos mundo afora. Uma fala mal formulada de um ministro pode fazer as ações de uma gigante do petróleo perderem 40% de seu valor num único dia. E aí? Quem determina quem, o fato o argumento ou o argumento o fato?

Calculem o que é uma expressão popular que atravessa os séculos - e que portanto foi espontaneamente formulada por uma sociedade de 200 anos atrás, mais ou menos. Não pode ser portadora de alguma "verdade", senão por sintoma. Ou: são ditos que visam preservar o controle de quem já controla, com imenso viés patrimonialista.

É a mesma função das histórias infantis ou das fábulas. João e Maria se perdem na Floresta e uma bruxa quase os devora. Portanto, "não saiam na floresta, crianças". As histórias infantis são até mais sofisticadas. Os adultos, séculos afora e adentro, fazem um papel muito mais passivo e dócil diante das narrativas de controle social. Uma criança - graças a Deus - ainda sai na floresta. Ela tem algo dentro de si chamado "curiosidade". 

quarta-feira, 21 de março de 2018

Síndrome de Rimbaud, por Gustavo Conde

Não sei se vocês estão acompanhado, mas Mark Zuckerberg e o Facebook estão sendo acossados pelo governo americano e por governos e imprensa em geral. Precisa desenhar?

Precisa. A marca do Facebook é a mais forte do mundo, mas as pessoas e as empresas que as usam não querem se submeter às regras de um garotão. De uma certa forma, o Facebook enfrenta um novo tipo de preconceito: o preconceito aos jovens geniais.

Homens brancos e velhos dão as cartas no mundo dos bilhões. Quando um jogador diferente senta nessa mesa, os veteranos praguejam, hesitam, cochicham e sacam as pistolas.

As falas da personagem de Sean Parker no filme "A Rede Social" são um tratado dessa síndrome. "Ninguém quer receber ordens de um moleque de 20 anos que é mais inteligente e talentoso do que você."

Essa síndrome se alastra. Empresários, publishers, editores se descabelam e conduzem uma campanha global de difamação, via conglomerados de mídia e artigos cirurgicamente encomendados - e pagos - a supostos especialistas em tecnologia. A ordem é: ataque-se o Facebook.

Usuários também provocam minha curiosidade sociológica. Não saem do Facebook e passam essas horas em rede atacando o próprio suporte que lhes dá voz.

A recomposição partidária brasileira - Parte 1, por Gustavo Conde

A situação é simples. O poder instituído e opressor precisa de um posto avançado nas fileiras populares de fato. Antes, esse posto era o PSDB, um partido supostamente de centro-esquerda e supostamente com projeto. O PSDB bastava para Folha, Globo et caterva como uma grife, uma marca que lhes permitissem dizer: olha como nós nos preocupamos com a questão social.

Essa marca morreu. O PSDB é o partido mais rejeitado do país - isso está nas pesquisas do 360, do Vox Populi e do Paraná Pesquisas, direta ou indiretamente. O PSDB virou um partido de direita, com bandeiras similares às de Jair Bolsonaro. Eles só não assumem essa condição de uma vez porque continuam em cima do muro. O PSDB é a covardia em forma de partido político.

Isso posto, o consórcio de poder classista precisa de uma marca adicional para poder continuar "dialogando" com segmentos progressistas. Sem segmento progressista - e isso deve estar no manual de redação política interna dos Frias e dos Marinhos - não se hegemoniza o termômetro da democracia controlada.

sábado, 10 de março de 2018

A hora e a vez das mídias alternativas, por Gustavo Conde

O Globo recebe dinheiro direto do mercado de propinas legalizado publicitário brasileiro, o "bônus de volume" do Grupo Globo. Por isso, não morre tão cedo. Mas Folha, Estadão e Veja dependem do rame-rame publicitário regional e dos favores pontuais do governo federal.
Basicamente, quem sustenta Folha, Estadão e Veja é o governo tucano do estado de São Paulo. Se o PSDB perder em São Paulo, esses três veículos não duram um ano (claro: se o vencedor não for o MDB ou um partido de aluguel).
À exceção do PT (e só o PT), o estado de São Paulo é povoado por partidos de aluguel. São todos propriedade do PSDB. Prefeituras do interior de São Paulo? Qua, qua, qua. PV, PSB, DEM, MDB, nanicos "do inferno", tudo é propriedade do PSDB de Geraldo Alckmin. Chega a ser risível quando alguém me diz que "é do PV". Eu digo: "é mesmo? V de Verde?". Nem eles sabem explicar direito o que representam.
E aí, passando os olhos no sempre péssimo jornalismo estampado na home do Estadão, fiquei pensando: quem paga por isso, caramba? Que vergonha! Anunciar aqui? Quem vai comprar um produto anunciado aqui? Só a elite quatrocentona de São Paulo, que é cada vez menor.
Folha, Estadão, Veja. A folha de pagamento desses caras é alta - ainda que paguem mal seus funcionários. É muita estrutura. Seriam muitos impostos também, mas sabe como é que é, né. Com três governos "amigos", Doria, Alckmin e Temer, esses veículos devem estar nadando em engenharia fiscal.
Daí, eu vejo, revejo, leio, releio um texto qualquer daquele jornal. Dá aquele sono pela absoluta lentidão e pela tradicional ausência de consistência factual, temática e narrativa. Há textos bons no Estadão, nas matérias especiais que não são de política, claro. Mas, é até uma pena que esses jornalistas estejam escondidos em um jornal como aquele.

Daqui do Facebook, por Gustavo Conde

Mais uma vez, repito: sou como a lagartixa. Não tenho o rabo preso nem comigo mesmo. De sorte que prefacio minha própria mini pensata dizendo isso porque sei que sensibilidades contorcer-se-ão na luxúria vacante dos delírios em rede.

Mesóclises à parte, vos assevero: compreender o que é novo exige desapego e uma ou outra gota de liberdade intelectual. O sujeito histórico se amarra, com razão, aos sentidos pré estabelecidos com imensa docilidade. São cães de guarda.

Do ponto de vista semântico, quase a totalidade da população mundial é conservadora. Só as crianças e os adolescentes escapam dessa estatística macabra - por isso, gosto tanto deles.

Mas, Gustavo, quanta enrolação, meu filho. Vai direto ao assunto! Não.

Tá bom, tá bom.... Eu vou.

De repente, o Facebook se transformou de novo no grande inimigo da "causa". É até tedioso. A porção social que se dispõe a produzir conteúdo também é preguiçosa - diferentemente da direita que é preguiçosa full time. Luta-se, luta-se, luta-se e, quando surge uma dificuldade inesperada, a culpa é de quem? Do Facebook.

Muitas mídias ainda não entenderam o que é o Facebook. Ainda que tenham ética jornalística, elas ainda operam dentro da "Lógica da Ana". Ou: da Ana Lógica.

São analógicos. Não é fácil lhes tirar a convicção. Eu só fico olhando. Porque não há na face dessa terra plataforma mais inteligente e democrática que o Facebook, para desgosto e profunda tristeza de toda legião de insatisfeitos.

Este singelo espaço que está diante de vossos olhos - o meu humilde perfil - é um dos instrumentos mais espetaculares de produção e gerenciamento de sentidos e de debates [este texto foi originalmente escrito para o Facebook]. A dicção aqui é coletiva. Eu me aproprio da inteligência de vocês e costuro reflexões frenéticas diariamente, dentro dos meus limites, mas também dentro de uma linha narrativa que se propaga e reflui, re-significada, em forma de comentários e desdobramentos, num processo sem fim. 

Do que se reclama, afinal, meu Deus?

sexta-feira, 9 de março de 2018

A idade da desrazão, Por Gustavo Conde

A questão da idade (tenho que dizer, com licença). O problema não são os bebês, nem os adolescentes, nem os adultos, nem os velhos, nem os mortos. O problema é o poder. O problema é a população economicamente ativa que se traduz no grau máximo da escala Richter do Darwinismo social.

Minha geração é o 'ó' do borogodó. Perdeu o sonho de criança e ainda não chegou na generosidade da velhice. É uma geração desgarrada, perdida, partida, destituída de sentidos. Se lerem este texto, vão inclusive dizer que estou "generalizando", tal é a hiperinterpretação que se apoderou de suas mentes inseguras. Não estou generalizando, estou argumentando. Não preciso dizer que há exceções. É desnecessário, deselegante, autoexplicativo.

O 'macho adulto' tem hormônio demais na cabeça. Inclusive são experts em projetar a responsabilidade pelas mazelas do mundo aos adolescentes. "Esses adolescentes estão perdidos". "Na minha época, era bem melhor". Quem não tem um parente obtuso ou um colega de trabalho que não teça essas peças da ignorância aplicada?

O ser de meia-idade é também de meio-raciocínio, social e conceitualmente falando (deixa eu desenhar, porque senão aparece alguém aqui esbravejando e me acusando de ser portador preconceito etário). Eu falo de uma 'posição social', gente. É o poder. Quem detém o poder na sociedade? Não são os velhos, nem as crianças, nem os adolescentes: são os machos adultos, cáspita! (Que, diga-se, desdobram-se em todos os gêneros e idades, tal é a sua força econômica, simbólica e cultural).