Destruição do país não poupou nem a Globo, por Gustavo Conde

O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) abriu investigação inédita contra o Grupo Globo. 

O estrago pode ser de grandes proporções. O jeito mafioso de controlar a publicidade brasileira (o bônus de volume) criado pela Globo, pela primeira vez, é colocado publicamente como prática potencialmente criminosa. 

Como se diz por aí, "demorou". E demorou, pelo menos 4 décadas. 

Algumas pessoas acham que tem um dedo político no Cade, mas eu acho que é exatamente o contrário: o dedo político desapareceu, com a pistolagem generalizada do bolsonarismo selvagem. 

Se o governo Bolsonaro quis enfraquecer a Globo por vingança, são duas notícias excelentes: 1) Bolsonaro enfraquece a si mesmo (já que a Globo faz a sustentação de seu governo) e 2) pela primeira vez na história, a Globo vai amargar uma denúncia grave contra sua operação historicamente mafiosa. 

Em briga de máfia, a gente não mete a colher. 

Diante da destruição generalizada do país, eu diria que há o que comemorar. Eu dizia, tempos atrás, que, se Bolsonaro destruir a Rede Globo, a explicação histórica para seu surgimento estará dada. 

Bolsonaro destrói o país há 2 anos. A Globo, há 50. 

Se com as nossas elites, com tudo, o povo soberano - através do PT - conseguiu elevar o Brasil a sexta economia mundial e a um dos países mais admirados do mundo, sem a Globo, a gente tenderia a se tornar, a médio prazo, na maior potência do planeta, pelo menos do que diz respeito à felicidade da população, à autoestima, ao PIB per capita e à produção científica.

Que notícia boa ver a Globo caminhando para o banco dos réus. 

Se ela cair, cai o fascismo, cai o ódio e cai a mentira. 

Há, no entanto, uma ponderação a fazer. 

Com a destruição do Brasil, a Globo acabou por se tornar, paradoxalmente, um vetor de contenção de máfias. 

Um núcleo mafioso tão grande e tão tentacular inibe a formação de novas quadrilhas. Numa terra arrasada, já dominada por milícias e pelo terrorismo urbano, o fim da Rede Globo pode jogar o Brasil ainda mais dramaticamente no caos. 

Basta pensar no nível de confusão mental que assola os setores autodenominados democráticos: eles estão mais perdidos do que cachorro cego que caiu do caminhão de mudança (muitos acham que a simples fato de não ser um fascista já resolve). 

Temos um misto de preconceito, de burocracia do pensamento, de institucionalização das utopias no território apodrecido da retórica. 

Sem o PT, o Brasil virou uma carnificina. Sem Globo - e com as atuais lideranças políticas que não lideram nada - a carnificina "democratizar-se-ia", por assim dizer. 

Lamento informar que, aparentemente, não há volta. 

Em alguns anos, o brasileiro terá de decidir concretamente se quer construir um país ou se quer lavar as mãos na gigantesca bacia cheia de sangue - sangue dos indígenas, dos pretos, das mulheres, dos ativistas, da comunidade LGBTQ. 

Nossa cota de contemporização já acabou. É hora de se preparar para construir um novo país.