domingo, 21 de novembro de 2021

O Caso Collini, por Wilson Ramos Filho


Esse mundo em que vivemos poderia ser melhor. Não faz sentido haver gente morrendo de fome ou de pobreza enquanto outros ostentam a opulência, a ganância e o individualismo. Em qualquer contabilidade social se percebe que há comida e bens para todos.

O problema das nossas sociedades está na sua distribuição e no acesso àquilo em que as vidas que valem a pena serem vividas se diferenciam das vidas somente sobrevividas. A miséria não é natural. Assim como a crença no sobrenatural, a pobreza é invenção humana. O fascismo também.
Entre a minoria que esbanja o que amealha explorando seus empregados e a enorme maioria explorada existe uma quase-classe social que, sem deixar de ser explorada, vive das migalhas dispensadas pela minoria com a qual se identifica existencialmente. Neste setor social são recrutados os agentes públicos que compõem no Brasil a Direita Concursada. Assim como os agentes no pequeno comércio, nos pequenos negócios, os prestadores de serviços em geral, os funcionários públicos integram esta pequena-burguesia. Nasci e fui criado neste contexto pequeno-burguês. Tenho lugar de fala, portanto, se me permitem a ironia.
Durante 10 anos, de 2003 a 2013, as políticas públicas dos governos liderados pelo PT promoveram a diminuição da pobreza e dos históricos mecanismos de discriminação e de diferenciação sociais. Uma parcela da pequena-burguesia não suportou ver negros na universidades, empregados viajando ao exterior, pobres andando de avião ou frequentando as praças de alimentação no shopping center. Muitos dos integrantes destes setores médios que promoveram as grandes manifestações de 2013, apoiaram o golpe, aplaudiram a destruição do Direito do Trabalho, elogiaram o teto de gastos que melhoravam a vida dos pobres, gozaram com as arbitrariedades da lavajato, votaram no Bolsonaro, festejaram a reforma da previdência que os prejudicam e agora tentam se desvincular das consequências desastrosas de suas decisões existenciais.
Quando reconquistarmos a democracia e conseguirmos a devolução dos militares aos quartéis para se empanturrarem de leite-condensado longe das nossas vistas e conseguirmos a condenação dos principais culpados pela destruição bolsonarista de nossas instituições, ainda teremos contas a acertar com os colaboracionistas que apoiaram todos os retrocessos civilizatórios de que somos vítimas.
Na Netflix pode ser encontrado o excelente filme O Caso Collini que trata da vergonhosa lei aprovada em 1968 pelo parlamento alemão que, na prática, isentava de responsabilidade os agentes públicos que colaboraram com o nazismo. Vale a pena assistir.
No Brasil estamos atentos e não deixaremos em paz todos os colaboracionistas que apoiaram ou se omitiram no golpe de 2016, os que aplaudiram a perseguição política ao Lula e ao PT, os que implantaram a reforma trabalhista apoiam a retirada de direitos da classe trabalhadora, os que votaram em Bolsonaro ou se omitiram no segundo turno, entre outros. Temos contas a acertar com essa gente ruim, com esses «colabôs» como se dizia na França no pós-guerra.
A Alemanha não fez a lição de casa. Não puniu os agentes públicos fascistas (https://www.dw.com/.../a-sombra-dos-nazistas.../a-59869289), pano de fundo do filme que motivou essas reflexões. O aparato repressivo estatal brasileiro está infestado de fascistas. Teremos que promover um acerto de contas com esses colaboracionistas do bolsonarismo até como forma de prevenir outras tentativas de tornar nosso país em um lugar pior do que já é.
Para que todos e todas possamos viver vidas que mereçam serem vividas esses colabôs precisam ser responsabilizados socialmente. A responsabilização destes canalhas é condição necessária para a construção de um mundo melhor e para a reconstrução do nosso país.
Depois de assistirem ao filme me contem (sem dar espoiler) o que acharam do desfecho.

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