quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

O pessimismo como (anti) valor social

Ser pessimista é uma arte. Dá ibope social, causa um efeito-inteligência, dá um up na beleza e no argumento. O cético é admirado, bem visto, concorrido, respeitado. Pena que ele seja também a ferramenta mais preciosa do sistema.
Alguns diriam: é melhor ser um pessimista vivo do que um otimista morto. Fato. Mas, durante a vida, essa ingrata, talvez seja melhor vivê-la, não fazer propaganda da sua desumanidade.
Achar - e advogar apaixonadamente - que o Brasil foi tomado por bandidos, que isso irá durar 50 anos, que não terá eleição, que Lula será preso, que vão votar no mesmo congresso, que "tá tudo dominado" é abaixar a cabeça e ficar de joelhos.
O que, aparentemente, trava o Brasil não é a burrice, nem a cordialidade do povo: é o ceticismo. É aquela certeza de que nada do que você faça ou sonhe terá consequência ou resultado.
Assim caminha a educação, por exemplo. O professor não acredita no sistema, não acredita na apostila, não acredita nos alunos, não acredita em si mesmo e, é óbvio, não acredita em resultado nenhum de nenhum lugar.
Vítima? De quem? Do sistema? Cultural? Daí, eu pergunto: o pensamento serve para quê?
O pensamento "entreguista" não é sinônimo de reflexão ponderada, de atitude preventiva, de pés no chão. O entreguismo é o que é: você doa sua capacidade de reação ao seu algoz, dia e noite. Não bastasse, anula e desanca com fervor os pares que lutam por você, que fazem greve, que pintam faixas, que tomam porrada de policial e que vivem na correria sem perder a ternura.
Já pensou se Darwin fosse cético? Se não acreditasse na sua tese? Se Fidel ficasse esperando (como Lula esperou) a democracia chegar em Cuba para se eleger? Se Chico Mendes calçasse o chinelinho e deixasse os seringueiros morrendo assassinados? Se Chomsky aceitasse que as teorias linguísticas vigentes eram boas e suficientes? Se Einstein dissesse que esse papo de curvatura da luz é impossível de provar?
Mais que cultural, o pessimismo glamourizado do brasileiro de esquerda classe média, é o sintoma máximo da sua baixa autoestima. Autoestima, no Brasil, é crime. Há um imenso cabresto imaginário travando a ação de todo e qualquer cidadão, seja na política, na arte, no trabalho ou na própria vida pessoal.
Não é fácil cultivar autoestima. Dá trabalho. Não dá ibope que nem o pessimismo intelectual. Exige disciplina e um pouco de humildade, humildade para identificar e ver as qualidades dos próprios pessimistas que te cercam, porque, é óbvio, eles as têm.
O resultado prático, interno, posso garantir: é avassalador. Mais do que produzir tudo o que você quiser e bem, a dimensão espiritual e mental da sua vida ganha amplitude. Você passa a equilibrar as percepções, entendendo, por exemplo, que uma pessoa humilde e sem estudo formal é intelectualmente muito mais interessante que a maioria dos acadêmicos de grife que produzem seguidores e opinião clichê de maneira industrial.
Você passa a entender que a riqueza intelectual não está no topo da pirâmide da educação, dessa educação brasileira viciada e limitadora, normativa, burocrática.
Essa percepção ainda deixa claro - ao contrário do que a leitura apressada poderia fazer crer - o quanto você deve lutar pela educação e por uma educação muito melhor do que essa que grassa pelo território brasileiro, do pré à pós graduação.
Lembrei agora: foi isso que Lula fez. Ele, sem estudo formal, construiu muitas universidades (que estão sendo destruídas e criminalizadas neste exato momento).
Em suma: que não se tente associar otimismo a ingenuidade e pessimismo a sabedoria. Essa significação é aquela que, por séculos, tem sustentado toda e qualquer estrutura de poder excludente, racista, patrimonialista, corrupta e cética. Ela não acredita em nada, senão nos próprios privilégios - e os defendem com todo o fervor.
É preciso gerenciar a timia otimismo/pessimismo, bloquear os sentidos históricos que a transforma em perfumaria ideológica. Porque, no final das contas, quem vive e respira não pode ser um pessimista convicto.

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